Primeira diretora de redação de Casa Claudia, de 1977 a 1990, a jornalista e arquiteta é uma desbravadora.
Olga Krell
“No início, pelo menos um terço das fotos era produzido”, conta Olga. Nesta imagem de 1973, ela aparece no Estúdio Abril montando um ambiente ainda para CLAUDIA.
Nesta foto de 1976, quando CASA CLAUDIA saía como edição especial, Olga Krell exibe o artesanato da feira de Caruaru, em Pernambuco. As peças estão hoje penduradas em sua varanda.
A casa pode ser um documento fiel para conhecer uma pessoa, principalmente se essa pessoa for Olga Krell, 77 anos, arquiteta e jornalista incansável na divulgação do design de interiores no Brasil. Projetada por ela nos anos 1970, a construção com fachada de tijolos onde mora, no Morumbi, em São Paulo, parece tão singular quanto a dona, esta senhora de cabelo impecável e olhar arguto, que ainda trabalha todos os dias e não perde um evento da área. Lá dentro, um paredão de vidro deixa entrar a luz do jardim com costelas-de-adão e palmeiras – nada mais tropical. Há silêncio para se perder entre tantos móveis de família, painéis chineses, caixinhas preciosas e coleções, sobretudo de artesanato brasileiro. “Acredito na mistura”, afirma. Nas paredes, pinturas retratam sua beleza serena. Olhando para elas, difícil não pensar em sua trajetória, uma história que começou em Cracóvia, na Polônia, sua terra natal.
Viagem para o futuro
Olga tinha 5 anos quando veio para o Brasil, fugindo com os pais da segunda guerra Mundial, em 1939. “saímos com a roupa do corpo em 2 de setembro, meu aniversário. Lembro-me do cheiro das bombas”, conta. o pai, arquiteto, pagou por uma carona em um ônibus com soldados poloneses em retirada da cidade, prestes a ser ocupada pelos alemães. Antes, enviou parte do que tinha para um banco suíço e comprou brilhantes.“Parece novela. Ele forrou os casacos com as pedras porque sabia que seriam nossas moedas na jornada.” A fuga teve passagens por Turquia, Índia, irã, iraque e África do sul, com hospedagens em casas de boas almas. “Na África do sul, na Cidade do Cabo, freiras nos aceitaram em um orfanato para esperar o navio até o Brasil. Quarenta anos depois, voltei para agradecer, mesmo que para outras pessoas.”
Encontro com o Brasil
O primeiro porto por aqui foi Recife. Olga Krell nem tinha idade para imaginar que, muitos anos depois, o Nordeste e especialmente Pernambuco, seu artesanato e sua gente se tornariam uma de suas maiores paixões, simbolizada pela figura de uma grande amiga, a arquiteta Janete Costa (1932-2008), referência na valorização da arte popular brasileira. “Mas meu pai estranhou a cidade.” Seguiram para o Rio de Janeiro. Por fim, para São Paulo. Aos 17 anos, mudou-se sozinha para Ithaca, nos Estados Unidos: era a única mulher na turma de arquitetura da Universidade de Cornell, onde teve aulas com nomes como Frank Lloyd Wright e – sim – Charles Eames. “Esse, eu adorava porque, além de tudo, era lindo, o que ajudava a prestar atenção”, lembra com graça. Lá, professores perguntavam se ela não preferiria cursar prendas domésticas. Não, ela não preferia. De volta ao Brasil, trabalhou como arquiteta por um ano, mas faltava algo. Em 1963, um convite responderia a esse vago anseio.
Vida de jornalista
“Por que não trabalha com a gente?” A pergunta vinha de Roberto Civita, filho do fundador e então presidente da Editora Abril, Victor Civita (1907-1990). “Éramos amigos desde a escola e ele sabia que eu estava descontente”, lembra Olga. Começou na Cozinha Experimental de CLAUDIA. “No início, achei que ela era só uma grã-fina. Mas pelo contrário: trabalhava feito louca. E tinha um senso de humor fantástico”, conta o designer Attilio Baschera, na época diretor de arte da Editora Abril. Já na redação de CLAUDIA, produzia ambientes e mesas bempostas. Logo vieram edições especiais sobre decoração e arquitetura, a partir de 1969. “Era difícil. Os arquitetos não queriam abrir seus projetos.” Porém as leitoras tomaram gosto e o resto é história: lançada como revista mensal em abril de 1977, CASA CLAUDIA se tornaria a maior publicação de decoração do país. Uma das marcas da direção de Olga, inspirada pelo encontro com Janete Costa, foi dar voz ao artesanato brasileiro, sempre presente nas reportagens – assim como em sua bela morada, até hoje. “A casa tem de ser como você. Minha mãe achava que a minha era uma feira livre: a prata inglesa junto do barro. Pois é como eu gosto.”
Fonte: Casa Claudia - Texto Silvia Gomez
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